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André... mais um viciado! |
Na generalidade dos desportos
quando os Deuses são generosos os atletas sorriem e agradecem à Dona Sorte. Na
Orientação não! Os praticantes de Orientação ficam fulos se sentem que a sorte
teve influência no seu sucesso. As regras internacionais referem explicitamente
que os percursos de Orientação têm que ser desenhados de forma a testar as
capacidades dos atletas e não a sua sorte!! N verdade nós nem sabemos quem
culpar pela existência deste desporto idiota. Os Noruegueses e Suecos reclamam
ter inventado a Orientação - a bela arte de nos perdermos (na verdade
acho que não passa duma estratégia para nenhum deles assumir as
culpas).
Quase todos os fins de semana
algumas centenas de pessoas juntam-se, algures no país, com o objectivo de
ficarem perdidos, ou pelo menos ligeiramente desorientados, para poderem
usufruir do prazer de se relocalizarem. Objectivo similar a bater com a cabeça
na parede, para depois sentir o prazer de parar! Armados com um mapa e uma
bússola eles partem à descoberta duma dúzia de pontos na floresta, numa espécie
de rally pedestre, mas com um papel colorido na mão. Para os pontos de controlo
são escolhidos elementos recônditos da área, tais como pedras, colinas, junções
de caminhos, vedações, postes de alta tensão ou mesmo uma qualquer árvore
isolada. Porque a "tal" árvore pode parecer exatamente igual à do lado (para o
principiante, claro), o traçador de percursos pendura lá um prisma triangular
laranja e branco, para que os participantes saibam que a “especial” é mesmo
aquela!
Os mapas de Orientação são
como as cartas militares, mas feitas para a Rua Sésamo. Para não complicar as
nossas cabecinhas, nem é preciso calcular declinações magnéticas para as
usar. As "linhas do norte"
nos mapas de Orientação são completamente inúteis, quer seja para encontrar o
shopping mais próximo ou mesmo o Mosteiro dos Jerónimos, porque na verdade as
linhas não apontam o norte! Pelo menos não apontam o Norte verdadeiro. Em vez
disso apontam para um ponto inóspito, desolado e assolado pelo vento nas ilhas
árticas canadianas - o polo norte magnético! E sim eles cartografam uma
ocasional árvore, bem como outros elementos menores com os quais o topógrafo
convencional não perderia qualquer tempo, tais como troncos, buracos,
formigueiros, bombas de incêndio e manjedouras.
Alguns deles com nomes que espantariam qualquer
escuteiro, tal como reentrância (um vale), esporão (crista do monte) ou colo
(espaço entre colinas).
Para além de usarem um
mapa mais detalhado do que o Hansel e a Gretel precisariam para encontrar a sua casa, os praticantes de
Orientação até usam bússolas sem marcas de graus, nem rosa-dos-ventos. Eles
apenas se preocupam com a localização do norte magnético (lembram-se das ilhas
inóspitas?). Armados desse conhecimento exotérico podem orientar (daí o nome do
desporto) o seu mapa para o alinhar com o terreno. Então, em vez de ir para o
bar ou pastelaria mais próxima, eles desaparecem na floresta à procura dumas
marcas laranja e branco, num quadrado com 30 cm e com três lados. Nessa altura vocês pensarão que
eles são recompensados pelos seus esforços, com algo saboroso como um ovo da
Páscoa ou o pote de ouro no fim do arco-íris. Não, em vez disso, eles enfiam um
chip num orifício para provar que estiveram lá. Pois é, eles têm que
provar que estiveram lá porque ninguém no seu perfeito juízo alguma vez lá iria.
Não estamos a falar apenas de montanhas majestosas, mas sim muitas vezes de
autênticos “cus de judas”.
Livres de escolher o
trajeto que quiserem, eles frequentemente evitam a opção lógica das estradas ou
mesmo dos caminhos. De facto, novamente de acordo com as regras internacionais,
os traçadores de percursos esforçam-se por tornar a opção mais rápida, na de
mais exigente e difícil navegação. Assim, eles são atraídos para escolherem a linha mais curta
entre dois pontos, que passa invariavelmente por declives acentuados e vegetação
cerrada e espinhosa, muitas vezes as mal-amadas silvas, conhecidas por não ceder
os seus frutos sem dar uma luta sangrenta.
Já mencionei a água?
Daquele tipo que a vossa mãe avisou para evitarem quando eram crianças. Charcos,
pântanos e lama, carradas de lama. De acordo com a tradição oral, nunca uma
prova de Orientação foi cancelada devido ao mau tempo. Sol ou chuva ganha outra
importância quando não podes pegar no cesto do picnic e abrigares-te no carro.
Reza a lenda, que algures para os lados de Estarreja, até
já se realizou uma prova com um incêndio a lavrar na mesma floresta e que mesmo
assim só ficaram por controlar os pontos que
arderam!
Os percursos dividem-se por
níveis de experiência, com uma duração que varia entre 20 e 90 minutos. A única
recompensa qe recebes por evoluíres tecnicamente, é que terás que percorrer uma
distância cada vez maior! Na Orientação todos têm o mesmo objectivo, que é
chegar rapidamente à meta que, para manter a retorcida lógica escandinava, se
situa o mais próximo possível da partida! Para além disso, quanto melhor és a
nível técnico, menos emocionante se torna a Orientação, já que os pontos não
aparecem de surpresa… tu já sabes que eles estão naquele local, ainda antes de
os veres. Mais grave ainda é que, em vez de fazeres uma festa ao ver a baliza,
como qualquer apaixonado que se preze, ainda nem viste o ponto de controlo e já
estarás a pensar no seguinte!
A Orientação é apresentada como
o "Desporto com pés e cabeça"! Mas afinal onde é que eles tinham a cabeça?
Se ficaram curiosos para
perceber qual as razões que levam estes doidos a voltarem sempre para mais
Orientação, podem visitar o site do Académico de Torres Vedras (www.atv.pt) ou o
da Federação Portuguesa de Orientação (www.fpo.pt).
Adaptado a partir de um artigo
de Robert Miller (USA)